Pontos Principais
Alguns produtores brasileiros de soja estão atrasando as vendas. A guerra comercial entre os EUA e a China e uma safra recorde contribuíram para essa decisão. No entanto, os riscos potenciais para essa estratégia incluem pressão de preços e concorrência da safra argentina.
Produtores de Soja Ajustam Estratégia Comercial
Alguns dos produtores de soja mais capitalizados do Brasil estão ajustando sua estratégia comercial, optando por não vender toda a sua produção no primeiro semestre. Essa decisão, no entanto, se restringe a uma pequena parte dos estoques e não afeta o volume de exportações, embora possa indicar uma tendência de mudança de comportamento de comercialização.
A novidade, no entanto, é que mais produtores estão dispostos a armazenar parte de sua produção, especialmente aqueles com menor necessidade de liquidez imediata e aqueles que possuem instalações próprias de armazenagem, como silos instalados em suas fazendas.
Vale ressaltar que o Brasil enfrenta um déficit crônico de capacidade de armazenagem, com claros sinais de agravamento. Essa limitação estrutural obriga muitos produtores a venderem rapidamente sua produção.

Guerra Comercial no Radar
Mas o que levou os produtores mais capitalizados a adiar a venda de parte de sua safra?
Um dos principais elementos dessa dinâmica é a guerra comercial entre os EUA e a China. Há um consenso generalizado de que isso poderia criar maiores oportunidades comerciais para a soja brasileira, à medida que o mercado chinês busca diversificar seus fornecedores americanos.
Hoje, o Brasil exporta mais de 70% de sua safra para a China. A China é o maior comprador mundial de soja, importando cerca de 100 milhões de toneladas por ano, principalmente para ração animal e óleo de cozinha.

Source: Comex
O precedente estabelecido durante o primeiro mandato de Donald Trump também desempenha um papel nessa equação. Entre 2018 e 2019, durante a primeira grande disputa comercial entre os dois países, o prêmio de exportação da soja brasileira — um valor adicional pago em relação ao preço internacional — aumenta significativamente, chegando a 148%. Isso se deve, em grande parte, à concentração de compras de soja pela China no Brasil.
Nesse período, o prêmio da soja brasileira saltou de US$ 1por saca para US$ 2,50 por saca, segundo levantamento da consultoria Cogo Inteligência. Embora um movimento dessa magnitude seja improvável no cenário atual — especialmente diante dos sinais de flexibilização das relações entre Washington e Pequim —, os produtores brasileiros mantêm expectativas moderadamente otimistas.
Afinal, os chineses pagarão um imposto adicional de 10% para comprar soja americana, enquanto o produto brasileiro permanece isento de tarifas.
A expectativa de safras recordes de soja neste ano representa um motivo adicional para os produtores adiarem parte de suas vendas para o segundo semestre. A produção brasileira deve chegar a quase 170 milhões de toneladas, garantindo um bom abastecimento de soja durante todo o ano.

Fonte: Conab
Adiar as Vendas Traz Riscos
Apesar das perspectivas promissoras, é importante considerar os riscos associados à estratégia de postergação da venda da safra. Um dos riscos mais evidentes é o chamado “efeito manada”: se um número significativo de produtores decidir reter seu produto ao mesmo tempo, a consequente liberação conjunta da oferta poderá pressionar os preços para baixo.
Outro fator importante a ser observado é a recuperação da safra argentina, que compete diretamente com a soja brasileira no mercado internacional. Segundo estimativas da Bolsa de Cereais de Buenos Aires, a Argentina deverá colher cerca de 50 milhões de toneladas neste ciclo — um volume aproximadamente 4% superior à safra anterior.
Diante desse conjunto de variáveis, os próximos meses serão cruciais para avaliar a evolução do mercado e a eficácia das estratégias adotadas pelos produtores.
