Pontos Principais

A paralisação do governo dos EUA e as novas taxas portuárias da China causam transtornos ao comércio. O aumento das tensões é o sinal mais claro até o momento de uma batalha prolongada entre as duas superpotências. A volatilidade das commodities continua com a queda dos preços do cacau, as mudanças nos mercados de grãos e as pressões climáticas afetando a agricultura. 

Paralisação do Governo dos EUA Suspende Divulgação de Dados

A paralisação do governo federal dos EUA (em andamento) cortou o fluxo de dados agrícolas e de commodities essenciais, deixando os mercados globais de grãos e oleaginosas sem referências importantes durante o pico da colheita de outono. 

A suspensão do relatório WASDE do USDA, dos relatórios semanais de vendas de exportação e dos dados de posição de mercado da Comissão de Negociação de Contratos Futuros de Commodities – CFTC (em inglês, Commodity Futures Trading Commission) criou uma lacuna de informação significativa em um ponto crítico da temporada. 

Analistas alertam que, quando os dados do USDA finalmente forem divulgados, os mercados poderão enfrentar uma correção acentuada, à medida que os traders recalibrarem suas posições com base em novos números oficiais. A falta de dados aumenta o risco de volatilidade e distorção do mercado, à medida que os traders navegam por informações incompletas e reavaliam a exposição. A ausência de números confiáveis do USDA ressaltou a dependência do sistema de dados públicos para manter a confiança e a estabilidade no comércio agrícola global. 

Impasse EUA-China Sobre Taxas Portuárias

Houve uma nova intensificação nas tensões comerciais EUA-China. A partir de 14 de outubro, os EUA imporão novas taxas portuárias da Seção 301 a navios construídos, de propriedade ou operados por entidades chinesas – uma política que deverá custar às 10 maiores transportadoras do mundo cerca de USD 3,2 bilhões no próximo ano, de acordo com a S&P Global.

O Representante Comercial dos EUA posicionou a medida como parte de um esforço mais amplo para combater o domínio da China na construção naval global e canalizar receitas para a revitalização do setor marítimo doméstico. Embarcações de propriedade ou operadas por entidades chinesas pagarão uma taxa fixa de USD 80/tonelada líquida por viagem para portos americanos, enquanto operadoras não chinesas que utilizam navios construídos na China pagarão USD 23/tonelada líquida ou USD 154/contêiner (o que for mais alto), com um limite de cinco escalas por ano. 

A regra já provocou ajustes significativos na frota, com transportadoras como a COSCO e a OOCL entre as mais expostas – potencialmente enfrentando mais de USD 1,5 bilhão em custos anuais. Algumas operadoras, incluindo a CMA CGM, realocaram embarcações construídas na China para outras rotas para limitar a exposição. Pequim anunciou taxas portuárias recíprocas para navios ligados aos EUA, enquanto o Premier Li Qiang prometeu contramedidas adicionais contra o que a China chama de tratamento “discriminatório”. 

Embora as taxas tenham sido reduzidas em relação às propostas iniciais após a resistência do setor, elas ainda representam um novo e importante encargo financeiro em meio à já frágil economia do transporte marítimo. 

Preços do Cacau Caem Após Alta

Os preços do cacau caíram para o menor nível em 20 meses, encerrando uma alta de dois anos que impactou de forma significativa os fabricantes de chocolate. O cacau em Nova York está sendo negociado em torno de USD 6.150/tonelada, abaixo do pico de dezembro (acima de USD 12.000), enquanto os preços de Londres caíram cerca de 58% em relação à máxima de abril de 2024. 

A queda é impulsionada pela menor demanda do consumidor, pela melhora das condições climáticas e pelos preços mais altos garantidos pelo estado na África Ocidental, o que aumentou as expectativas de uma colheita maior em 2025-26. Os governos da Costa do Marfim e de Gana, que juntos produzem cerca de 60% do cacau global, aumentaram os preços pagos aos agricultores, incentivando mais vendas oficiais, uso de fertilizantes, podas e substituição de árvores. 

Apesar da queda dos preços, os riscos estruturais – incluindo o envelhecimento das árvores, as doenças nas plantações e a volatilidade climática permanecem, tornando improvável um retorno aos níveis de preços anteriores a 2023. 

Cacau Doente 

A queda dos preços pode proporcionar alívio aos fabricantes de chocolate, mas provavelmente reduzirá as margens dos produtores, destacando a sensibilidade das commodities tropicais de alto valor às mudanças na demanda. 

Preços dos Grãos Cada Vez Mais Voláteis 

Os mercados de milho permanecem sob pressão, com o atraso nas colheitas na Ucrânia e a forte concorrência das Américas impulsionando as oscilações de preços. O clima frio e úmido atrasou o trabalho de campo na Ucrânia, com cerca de apenas 5% da colheita de milho concluída até o final de setembro, em comparação com quase um quarto no ano passado. 

A produtividade está menor e, embora os portos tenham começado a receber grãos da nova safra, a fraca demanda por exportação empurrou os preços para baixo, para cerca de USD 205–207/tonelada. Enquanto isso, as abundantes exportações dos EUA e da Argentina estão pesando sobre os valores globais. Os embarques de milho dos EUA aumentaram mais de 50% em relação ao ano anterior, pressionando os preços dos contratos futuros para baixo e tirando os exportadores ucranianos do mercado da UE. 

O comércio global de soja permanece instável, com os EUA lutando para substituir a demanda perdida da China. Com as tarifas tornando a soja americana pouco competitiva na China, os exportadores se voltaram para mercados menores, como Vietnã, Bangladesh e Nigéria. Esses novos compradores, no entanto, representam apenas uma fração das compras anteriores da China, o que diminui as exportações totais dos EUA e deixa os preços próximos dos menores níveis em muitos anos. Muitos agricultores, principalmente em Illinois, estão armazenando suas safras na esperança de uma recuperação, mas os esforços de diversificação comercial ainda não compensaram a perda de seu maior mercado. 

Fonte: USDA

Os fluxos de trigo também estão mudando, à medida que Bangladesh aprofunda os laços com os EUA através de um acordo entre governos para 220.000 toneladas de trigo americano a USD 308/tonelada. O acordo, parte de um plano de 5 anos para até 700.000 toneladas anuais, visa reduzir a dependência de Daca de suprimentos mais baratos do Mar Negro e melhorar as relações comerciais com Washington. Para os EUA, o acordo reflete um impulso mais amplo para abrir novos mercados à medida que a concorrência global se intensifica.

As importações de óleo comestível da Índia destacam a mudança na dinâmica do complexo de oleaginosas. As chegadas de óleo de palma caíram 16% em setembro, para 829.000 toneladas – o menor volume desde maio -, com as refinarias migrando para o óleo de soja, mais barato, cujas importações aumentaram quase 37%, atingindo o maior nível em três anos. Espera-se que a mudança pressione os contratos futuros do óleo de palma da Malásia, ao mesmo tempo em que dá suporte aos preços do óleo de soja nos EUA. A Índia, maior compradora mundial de óleos vegetais, comprou quantidades recordes de óleo de soja da Argentina após a suspensão dos impostos de exportação, demonstrando como os preços e as políticas estão remodelando o comércio global de oleaginosas. 

Fonte: Global Trade Tracker

Mercados de Alimentos e Rações se Adaptam 

No Reino Unido, mais de 7 milhões de toneladas de trigo foram perdidas desde 2020 devido a secas e inundações, reduzindo a autossuficiência de 96% para 79% e forçando os moleiros a depender de importações recordes. 2025 deverá ser mais um ano ruim, com clima quente e seco e restrições de irrigação prejudicando o plantio e o crescimento. Projeções a longo prazo indicam extremos contínuos de chuva e secas, desafiando a agricultura doméstica e a segurança alimentar. 

Fonte: Defra

Do outro lado do Atlântico, os preços da carne bovina nos EUA subiram quase 33% em relação ao ano anterior, com a seca e os altos custos dos insumos reduzindo os rebanhos e as taxas de abate. As importações de carne bovina aumentaram cerca de 16% no primeiro semestre de 2025, pressionando os preços no varejo. Os produtores estão mantendo o gado, prevendo novos aumentos de preços, enquanto processadores e varejistas enfrentam custos mais altos.

Fonte: USDA

Em Outras Notícias…

  • Europa Importará Mais GNL Neste Inverno: A Europa precisará de até 160 remessas extras de gás natural liquefeito (GNL) neste inverno, devido à queda no fornecimento de gasodutos da Rússia e da Argélia e os baixos níveis de armazenamento. A região está dependendo mais do GNL dos EUA, o que pode tornar os preços mais sensíveis à demanda global e aos custos de transporte. 

Fonte: GIE AGSI

Lucas Blaxall

Lucas joined CZ in August 2024 after graduating from Queen Mary University of London. As an intern on the analyst team, he contributes to managing and editing content across CZ's digital platforms.
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